(Texto de Nilton Marchesini)
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Foto de 2011, no niver da Isa, às margens do belìssimo lago de Lugano (Suiça) |
Acabou mais um ano. E um outro ano começou. E como sempre, esse dias de fim de ano sao uma grande oportunidade para fazermos uma reflexao sobre o que fizemos ou deixamos de fazer, e um projeto para o que queremos e nao queremos para o ano novo. Alguns prometem fazer regime, outros prometem ser um conjuge melhor, e assim vai. Alguns se dedicam realmente ao que prometeram, mas a maioria tem apenas um sentimento de momento, e depois volta tudo novamente como era antes.
Nesses dias em que nao trabalhei, por motivo de recesso empresarial, aproveitei para também fazer um balanço desses ùltimos anos, desde que chegamos à Italia. Minha e esposa e eu chagamos aqui em setembro de 2003. Nossos filhos vieram somente nove meses depois. Foram tempos duros aqueles.
Sozinhos, sem amigos e sem parentes, sem nenhum conhecido, nos vimos imergidos em uma situaçao que nao havìamos previsto. O dinheiro ja havia acabado, a ponto de um dia, termos decidido retornar, mas nao pudemos remarcar a passagem de retorno, porque nao haviamos cem dòlares para cada um, para tal operaçao na companhia aérea.
Certo dia, nossa filha menor, que havia apenas quatro anos, nos disse ao telefone: "Voces nao me amam mais? Porque falam de vir me buscar mas nunca vem!" Aquele dia foi terrìvel para nòs. Foi como se o mundo tivesse desabado em nossa cabeça. Como poderiamos fazer uma menina de quatro anos entender as vississitudes da vida adulta, cheias de erros e situaçoes que fogem do controle?
Nòs, que no Brasil, havìamos uma casa (e a temos ainda), um carro, profissoes, emprego, reputaçao, etc, e trocamos tudo por um ideal que nao estava sendo alcançado, e que, pra dizer a verdade, ja nao estava mais valendo a pena, e o pior, agora jà nao dava mais para voltar atràs. Estàvamos em meio a uma estrada onde era quase impossìvel voltar, mas também nao era fàcil seguir em frente.
Nos seis primeiros meses aqui na Italia, tivemos que mudar de endereço seis vezes. E como o sistema europeu é bem diferente do brasileiro, tivemos que nos adaptar a ele, pois aqui, somos nòs os estranjeiros. Habitando sempre em casas com outras pessoas, as vezes com uma sò familia, as vezes com pessoas de diversas familias, acumuladas em dois ou tres comodos, dividindo o pouco espaço da casa, o mesmo fogao e o mesmo banheiro, e até o mesmo quarto, a mesma sala. Pessoas de muitas nacionalidades, cada uma usando o fogao a seu tempo, com comidas de sua tradiçao, tendo que terminar velozmente, e lavar tudo para os pròximos da fila. Nao tìnhamos nenhuma mobìlia e todo o nosso guarda-roupa estava dentro de duas malas para cada um. Para quem nunca teve nada poderia ser muito, mas para mim, que somente de livros havia deixado quase 1200 no Brasil, e a Isa que havia deixado um fogao novinho, novinho, de seis bocas e um guarda-roupas de seis portas, em cerejeira pura, entre outras coisas, era algo que nos fazia muita falta.
Quando o emprego vinha, nem era emprego no sentido da palavra, eram apenas "bicos" de um ou dois dias, ou de uma semana, o que nao era nem o suficiente para pagarmos o aluguel e as despesas bàsicas.
O fim no ano se aproximava, e com ele, o frio do inverno rigoroso europeu. Vimos a neve pela primeria vez, e nos arrancou um sorriso. Mas nao era o suficiente. Foi um natal triste. Um dos mais tristes de toda a nossa vida. Saude nao faltava, mas o coraçao estava em pedaços. Sò não foi mais triste porque o irmao da Isa, que estava indo para a Espanha, passou por aqui e nos fez companhia por uns 25 dias, incluindo o natal e o ano novo de 2004.
Eu me lamentava ainda mais, por ter envolvido a Isa nesta situaçao. Expor uma mulher a uma situaçao destas é algo de que um homem deveria se envergonhar, sempre. Mas ela foi uma heroina. Mesmo sofrendo a ausencia dos filhos, o aconchego da casa, jamais se lamentou ou me condenou por minhas decisoes, pois embora ambos tenhamos acordado com todas as decisoes, quando ainda estàvamos no Brasil, a verdade é que todas as idéias e todos os sonhos, partiam de mim. Ela foi ainda mais batalhadora, quando eu voltei ao Brasil buscar as crianças e tive que ficar là por tres meses, deixando-a sozinha aqui, na casa de uma família de irmaos em Cristo que haviamos conhecido aqui.